Negativa Do Funcionário Público De Emitir Certidão Pode Constituir Crime?

Discussão em 'Direito Administrativo' iniciado por diegopenalver, 16 de Janeiro de 2014.

  1. diegopenalver

    diegopenalver Em análise

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    Boa tarde pessoal!


    Estou com uma grande dúvida. Sei que é direito de todo o cidadão obter certidão de órgãos da administração pública, autarquias, fundações públicas e afins:

    Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
    XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
    b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;


    Bem como a Constituição determina a necessidade de um regramento para os funcionários públicos:

    Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
    § 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente:
    I - as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços;
    II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII.


    O dever do servidor público federal de fornecer certidões é regulamentado pela Lei Nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que assim dispõe:

    Art. 116.  São deveres do servidor:
    I - exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo;
    III - observar as normas legais e regulamentares;
    V - atender com presteza:
     a) ao público em geral, prestando as informações requeridas, ressalvadas as protegidas por sigilo;
    b) à expedição de certidões requeridas para defesa de direito ou esclarecimento de situações de interesse pessoal;


    No caso dos servidores estaduais foram criados regramentos específicos, como a Lei Complementar Nº 10.098, de 03 de Fevereiro de 1994, que regulamenta os deveres dos servidores públicos do Estado do Rio Grande do Sul:

    Art. 177 - São deveres do servidor:
    V - observar as normas legais e regulamentares;
    VIII - atender com presteza:
    a) o público em geral, prestando as informações requeridas que estiverem a seu alcance, ressalvadas as protegidas por sigilo;
    b) à expedição de certidões requeridas, para defesa de direito ou esclarecimento de situações de interesse pessoal;


    Existe prazo e regras para sua obtenção:

    Art. 1° - As certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações, requeridas aos órgãos da administração centralizada e autárquica, as empresa pública, às sociedades de economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, deverão ser expedidas no  prazo improrrogável de quinze dias, contado do registro do pedido no órgão expedidor”.
    Parágrafo único – nos requerimentos que objetivam a obtenção das certidões a que se referem esta lei, deverão os interessados fazer constar esclarecimentos relativos aos fins e razões do pedido

    Sei que é possível, dependendo do caso a utilização de outros remédios jurídicos como o mandado de segurança e habeas-data:

    Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
    LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
    LXXII - conceder-se-á "habeas-data": a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.


    Mas a dúvida cerne da questão é se podemos imputar ao servidor público que nega o fornecimento da certidão o crime de prevaricação, artigo 319, do Código Penal:

    Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:


    Estou tendo diversos problemas nesse sentido, bem como não encontro entendimento jurisprudencial ou doutrinária sobre o tema, talvez pelos envolvidos optarem pelos habeas ou mandado de segurança ao invés de registrar uma ocorrência como prevaricação, ou ainda minha errada associação, pelo exíguo conhecimento penal.

    Agradeço desde já a ajuda a esclarecer tal fato, visto que a dificuldade em obtenção de certidões em procedimentos administrativos garante a alguns servidores a possibilidade de dificultar o acesso dos cidadãos aos direitos e garantias.


    Resumo da pergunta: É possível imputar o crime de prevaricação ao servidor público que nega ao cidadão o direito de obtenção de sertidão do artigo 5.º, XXXIV, b, da CF?
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  2. GONCALO

    GONCALO Avaliador

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    Bom dia:
    Entendo que, na teoria,  em qualquer das nuances da prevaricação, a resposta seria afirmativa:
    [SIZE=9pt]Prevaricação na modalidade omissiva I:[/SIZE] [SIZE=9pt]Um funcionário público se recusar a entregar documentos solicitados por um cidadão de quem ele não gosta. [/SIZE]
    [SIZE=9pt]Prevaricação na modalidade omissiva II:[/SIZE] [SIZE=9pt]Um funcionário público se recusa a receber algum documento (protocolado ou não) de um cidadão, solicitando informações, alegando não poder receber por qualquer motivo (administrativo e/ou pessoal).[/SIZE]
    [SIZE=9pt]Prevaricação na modalidade comissiva:[/SIZE] [SIZE=9pt]Um funcionário público adiar a entrega de documentos solicitados por um cidadão de quem ele não gosta até passar o prazo de entrega desses documentos.[/SIZE]
    Entretanto,  infelizmente, só na teoria....
  3. gustavocastro

    gustavocastro Membro Pleno

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    Procedimento administrativo; habeas data e BO e ação.

    Muitos procedimentos burocráticos por uma certidão, mas o gostinho de ver quem não trabalha, nem sabe trabalhar pagar por isso, não tem preço.
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  4. jrpribeiro

    jrpribeiro Advogado

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    Prezados colegas, boa tarde.

    Bem lembrado pelos colegas Gonçalo e Gustavo.
    Sempre me resta um sentimento de abandono quando penso que há tantas leis a nos proteger e as pessoas que tem o dever de zelar pelo seu cumprimento, são as que mais a ignoram...

    Cordialmente.
  5. diegopenalver

    diegopenalver Em análise

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    Certo, mas alguém tem conhecimento de julgados nesse sentido ou doutrina sobre o tema?. É que realmente entendo que preciso ter segurança jurídica para efetuar o registro do BO, para não cair na bobagem de imputar crime a uma conduta atípica.
  6. diegopenalver

    diegopenalver Em análise

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    Peço igualmente aos amigos que ignorem o absurdo erro de grafia de "sertidão" com S.  :blink:
  7. fmbaldo

    fmbaldo Editores

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    Eu impetraria um MS e solicitaria as providências penais ao Juiz.
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