Qualificação Doutrinária Do Aborto Necessário

Discussão em 'Direito Penal e Processo Penal' iniciado por darossa, 03 de Setembro de 2009.

  1. darossa

    darossa Em análise

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    Olá! Fico feliz de ter descoberto este forum. Todos deveriam usá-lo!

    Sabem se existe algum autor que considere o aborto necessário como excludente de punibilidade , e não de ilicitude? independente do resultado prático dessa consideração, talvez tenha algum autor, ainda que mais antigo, que use uma interpretação mais gramatical, e, atento à redação do art. 128 do Código Penal: "Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico: ... " admita-o. quem?

    Sei que a doutrina atual, praticamente absoluta, considera o aborto legal como excludente de ilicitude pois exclui-se o crime, dado que o nosso Código Penal segue, hoje em dia, a teoria finalista.

    Então, existe algum autor que se posicione da maneira minoritária (ou mesmo isolada)? Por favor me indiquem bem como, se possível, o título da obra e ano de edição.

    Obrigado desde já!
  2. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Caro colega,

    Não sou muito chegado à prática criminal, mas é um ramo sensacional do Direito. Creio que o texto do referido artigo não é claro ao desconsiderar a tipicidade da conduta exposta na norma legal. É uma questão pertinente, qual seria a mens legis? Desconsiderar o crime ou afastar sua punibilidade? Então seria condenável para os efeitos de reincidência, e.g.?

    Agora, um fato que eu acho interessante é o seguinte:

    E se o médico se recusa a praticar o aborto (ou abortamento, mais precisamente) mesmo quando ele é necessário? É fato típico? É desobediência? É cabível tal recusa pelo profissional?


    Gostaria da posição dos colegas.

    Obrigado.
  3. HeryckDM

    HeryckDM .∙.

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    Há quem acredite tratar-se de mera exclusão de punibilidade, no entanto defendo assim como a corrente majoritária tratar-se de excludente de ilicitude. Embora em primeira análise e atendo-se gramaticalmente a questão, possamos perceber que se trata de excludente de punibilidade.

    quanto a questão do caro colega Ribeiro, vou mais além, percebendo o médico que trata-se de um caso em que seja necessário o aborto e escolher por não praticar o procedimento, deverá ser processado por homicídio.
  4. Fernando Zimmermann

    Fernando Zimmermann Administrador

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    Saudações a todos,

    A pedido, a mensagem que tratava de aborto anencéfalo foi convertida em tópico à parte, localizado aqui:

    http://www.forumjuridico.org/topic/8156-aborto-anencefalo/

    Abraços,
  5. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    A beleza do Direito repousa na pluralidade de fatos que desaguam dentro da lei e assim nos dá um fértil campo de trabalho.

    Vejo que pela letra fria do comando normativo é causa de exclusão de punibilidade, o que conservaria todos os demais efeitos da condenação, certo? Assim, negar-se a praticar o abortamento necessário não seria deixar de cumprir um "juramento de profissão" para obedecer a lei?

    É um caso delicado, pertinente e usual. Infelizmente nossos legisladores não se preocupam com estas questões tão próximas da população, enquanto ocupam suas cabeças com orçamentos e tributos.

    Complicado.

    Recordo-me que quando era um bacharelando escrevi um artigo científico (que optei por não publica-lo) sobre a viabilidade prática da utilização do abortamento como método contraceptivo. Há limites éticos e orçamentários nisso, haja vista que, querendo ou não, praticar um aborto implica em custos dentro do sistema de saúde pública. Um dos tópicos desenvolvidos neste artigo foi justamente sobre a possibilidade do médico negar-se a praticar um aborto, por qualquer motivo que seja. Então, no caso que o colega suscitou: não praticar o aborto quando necessário seria um crime de homicídio culposo, pelo atentado contra a vida da gestante. Ocorre que se esta não vier a falecer, a conduta culposa na forma tentada não seria crime. Mas a intenção do médico era de matar? Ele não saberia dos riscos de sua conduta (omissiva, no caso)? E as questões subjetivas que levaram a decisão do médico?
  6. darossa

    darossa Em análise

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    Obrigado pelas respostas! Mas então, qual é o autor que reconhece oaborto necessário como excludente de punibilidade? Tem certeza queexiste pelo menos 1, HeryckDM?
  7. HeryckDM

    HeryckDM .∙.

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    Eu me atentei ao seu pedido caro colega, no entanto no momento não me veio a memória algum nome de doutrinador que defenda tal posicionamento, assim como agora não me vêm, no entanto não faltam artigos que defendem esta hipótese. Olharei hoje na biblioteca da faculdade e caso encontre logo mais voltarei aqui para informa-lo.
  8. darossa

    darossa Em análise

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    Nem sei por onde começar a agradecê-lo.
  9. darossa

    darossa Em análise

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    @ Ribeiro Junior

    Obrigado pelo post!
    Mas não entendo, como assim "aborto como método contraceptivo"? O aborto é pós-concepção! :)

    Sobre a questão do médico indeciso, que você trouxe à tona: na verdade, seria exatamente isso, pois o aborto só é considerado necessário mesmo se não houver outro meio de salvar a vida da gestante, mas não em caso de mero risco de vida. Mas o que mais acontece é o médico imaginar que existe um risco, o que é algo especulativo, e iniciar o procedimento. Raras são as vezes em que a vida da gestante realmente estava por um fio, em que não fosse possível salvar-lhe a vida por outro meio, mas incrivelmente você não encontrará provas nenhuma de que tal aborto reputado como necessário foi na verdade praticado para afastar um mero risco, e não a certeza de morte.

    No caso de a mãe não vir a falecer, significa exatamente que ela não estava no limite entre a vida e a morte, e não se concretizou a hipótese do art. 128, inciso I do Código Penal. Ter uma gravidez "de risco" não deve, de forma alguma, ensejar o aborto.

    Outra coisa que não entendo: a gravidez é dita de risco, e isso já é suficiente, na prática, para que se aborte. Mas o próprio procedimento abortivo não é muito mais arriscado? Isso porque uma gravidez nos primeiros estagios não pode ser tão arriscada quanto nos últimos para a mãe.
  10. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Caro Ross,

    Realmente, é hipótese de controle de natalidade. De fato, o tema foi-me sugerido pelo orientador da matéria, isso nos idos tempos de faculdade. Abracei o desafio de justificar o título, e busquei traçar um comparativo com a Pílula de Emergência, ou Do Dia Seguinte. De fato, gramaticalmente, concordo com sua crítica.

    Estamos diante do que alguns autores chamam de "Zona Cinzenta do Direito". Há diversas hipóteses em que será difícil (ou até mesmo impossível) a aplicação do Direito em face ao subjetivismo lançado pelo legislador. Outro exemplo clássico é o crime de Ato Obsceno, o qual não há definição legal do que seja obsceno, nem mesmo do que venha a ser local público.

    Suas colocações são deveras pertinentes. Quem pode medir a seriedade do julgamento profissional de um profissional da área de saúde no momento de sua realização. Existem diversas interpretações para cada caso, assim como na nossa profissão. São obrigações de meio. Os próprios órgãos de representativos de classe se propõem a realizar tal juízo.

    Agora, vale trazer à baila um caso concreto, ocorrido na minha família: em uma gravidez dita de risco, havia a probabilidade enorme da criança vir a nascer com alguns problemas congenitos, em decorrência de uma vacina que a mãe teria tomado dias antes da concepção. O médico opinou pelo aborto. A mãe insistiu na gravidez, juntamente com o pai da criança - que é meu primo. Hoje a menina tem sete anos, é saudável, ativa e inteligente.

    Isto demonstra e reforça suas indagações. Mas, sob a epígrafe de proteger a vida da mãe, poderia o médico ter praticado o abortamento mesmo sem seu consentimento?



    Att.,

    Ribeiro Júnior
  11. HeryckDM

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    Caso haja um lapso de tempo onde seja viável pedir autorização dos responsáveis pela gestante, o médico jamais poderá faze-lo sem consentimento da gestante ou quem for seu responsável. No entanto, no decurso de uma cirurgia ou qualquer outra situação de emergência trata-se ao meu ver de estado de necessidade.
  12. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Eis o ponto de debate: a análise de cada caso podem ser distintas de um profissional para outro. Também entendo no estado de necessidade, remeto até mesmo ao julgamento de Hipócrates e o dever médico de salvar vidas. São diversos os exemplos e multiplos os posicionamentos adotados.
  13. HeryckDM

    HeryckDM .∙.

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    Caro Ribeiro Jr,

    a análise de cada caso podem ser distintas de um profissional para outro

    bom, aí vai do caso concreto né!


    Um diagnostico errado? Erro de tipo?

    São muitas as possibilidades, realmente só o caso concreto pode responder =)
  14. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Entendo q seria a hipótese de um diagnóstico errado, e não de erro de tipo.

    Como dizem por aí: "cada caso é um caso". (Risos)


    Acho q este debate findou aqui. Deixemos os problemas probatórios para cada processo em particular. =)

    Parabéns a todos os colegas pelas colocações sempre pertinentes e brilhantes.


    Saudações,

    Ribeiro Júnior
  15. darossa

    darossa Em análise

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    :)
    Obrigado por todas as colocações dos senhores.

    Mas então, já temos o nome do autor? :D
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